Mairiense Aly Muritiba, de 'Para Minha Amada Morta', destoa dos cineastas do país

A trajetória de Aly Muritiba pode ser vista como um exemplo de como o perfil dos realizadores de cinema no país tem se transformado.

Nascido na Bahia e radicado no Paraná, Muritiba não tem origem economicamente privilegiada nem veio do eixo Rio-São Paulo –porém, dirigiu filmes que o colocaram no mapa internacional.

"Para Minha Amada Morta", sua estreia em longa de ficção, saiu premiado do Festival de Montreal e do de Brasília.

Antes, seu curta "Pátio" (2013) foi selecionado para a Semana da Crítica de Cannes, e o mais recente, "Tarântula", dirigido com Marja Calafange, esteve na mostra Horizontes do Festival de Veneza.

Muritiba é natural de Mairi-BA, foi para São Paulo, onde foi acolhido na casa de uma tia, na periferia de Perus, e começou a trabalhar na Companhia Paulista de Trens Metropolitanos.

A trajetória singular de Aly Muritiba pode ser vista como um exemplo, entre tantos, de como o perfil dos realizadores de cinema no país tem se transformado. Nascido na Bahia e radicado no Paraná, Muritiba não tem origem privilegiada economicamente nem saiu do eixo Rio-São Paulo - e, no entanto, dirigiu filmes que o colocaram no mapa internacional.

"Para Minha Amada Morta", sua estreia em longa de ficção, saiu premiado do Festival de Montreal e do Festival de Brasília, em setembro passado. Antes, seu curta "Pátio" (2013) foi selecionado para a Semana da Crítica de Cannes, e o mais recente, "Tarântula", dirigido em parceria com Marja Calafange, esteve na mostra Orizzonti do Festival de Veneza.

Aly Muritiba nasceu em Mairi, interior da Bahia, de onde saiu aos 17 anos. "Mairi é uma cidade muito pequena. Quando você termina o ensino médio, não tem muitas opções a não ser seguir a profissão do pai. Meu pai era caminhoneiro, eu não queria ser caminhoneiro", conta o cineasta, que conversou com a Folha durante o Festival de Brasília.

Da Bahia ele foi para São Paulo, onde foi acolhido na casa de uma tia, na periferia de Perus, e começou a trabalhar na Companhia Paulista de Trens Metropolitanos. Passou no vestibular da USP para História e, na universidade, conheceu sua mulher, que o levou para Curitiba.

Lá, teve dificuldades de conseguir emprego. "Um historiador não tem muitas opções, e Curitiba é uma cidade bem preconceituosa com nordestino", conta.

Muritiba prestou dois concursos públicos: um para o Corpo de Bombeiros e outro para agente penitenciário. Passou nos dois. Começou a trabalhar como bombeiro, mas o salário era muito baixo. Quando o sistema penitenciário o chamou, o salário era três vezes maior. 
"Precisava da grana e fui trabalhar lá".
Fernando Alves Pinto
Foi um choque, claro. "Imagina um cara de formação humanista, que tomou bala de borracha nas greves estudantis, de repente se ver do outro lado. Essa experiência prisional foi determinante para mim. A escala do agente penitenciário é maluca, você passa um terço da vida preso, também se sente atrás das grades", lembra. "Pensava: estou preso, preciso dar um jeito de sair".

Foi quando tomou conhecimento de uma brecha no sistema: o agente que fizer um curso superior é liberado pelo tempo do curso, sem desconto no salário. "Procurei então cursos superiores vespertinos, e o único nessas condições, em Curitiba, era cinema".

Desde que entrou no curso, em 2007, sua vida se transformou. Conheceu Antônio Junior e a Marisa Merlo, que se tornaram seus sócios na Grafo Audiovisual, hoje uma produtora estabelecida.

"Decidimos que seria uma produtora com sede e horário de trabalho, que permitisse a gente fazer o que quisesse, mas de alguma maneira se sustentasse. Demorou três anos até que a produtora engrenasse e eu pudesse deixar o emprego de agente penitenciário.

A experiência na prisão é a fonte de inspiração do curta "Pátio" e do documentário "A Gente", e o personagem principal de "Para Minha Amada Morta" é um fotógrafo que trabalha como perito.

"Nossa memória é traidora. Hoje olho para os meus tempos como agente penitenciário com certo saudosismo. Há algum mecanismo de defesa no nosso cérebro que dispara esse sentimento. Mas a verdade é que eu passei a ter uma visão muito mais complexa das coisas depois de passar por essa experiência. Lá fiz amigos que visito até hoje".

PARA MINHA AMADA MORTA
DIREÇÃO Aly Muritiba
PRODUÇÃO Brasil, 2015, 16 anos
QUANDO segunda (2), às 19h, Espaço Itaú - Frei Caneca 2; quarta (4), às 14h, Cinearte 1

Fonte: Folha de São Paulo

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